02 fevereiro 2007

Entrevista – Sebastião Curió Rodrigues de Moura Parte I - Serra Pelada e Curionópolis

Sebastião Curió Rodrigues de Moura, 72 anos, pisou no Sul do Pará pela primeira vez em 1972. Enviado pelo governo militar para comandar uma operação de inteligência, ele tinha a missão de identificar os guerrilheiros do Partido Comunista do Brasil (PC do B) no Araguaia. A segunda vez foi em 1980, quando foi descoberto ouro em Serra Pelada. Ele foi para lá, então, como interventor federal para colocar ordem no garimpo. Oito anos depois, fundou o município de Curionópolis, que recebeu nome em homenagem a ele. Hoje, o major ainda manda no pedaço de chão à beira do Km 30 da rodovia PA-275, mas como prefeito eleito democraticamente.

O apelido de Curió que ainda o acompanha surgiu nos primeiros anos do exército, quando ele freqüentava a Escola Preparatória de Cadetes, em Fortaleza, na década de 1950. Curió lutava boxe nos fins de semana para completar o dinheiro do soldo. “No Exército, eu recebia como o pagamento de 100 cruzeiros velhos por mês. Com a luta, recebia mais 150 cruzeiros velhos por semana”, lembra-se o major. A fama de brigão de quando era lutador o acompanha até hoje. “Ainda me considero bom de briga. Sou fácil de conviver desde que meus direitos sejam respeitados. Não levo para casa nenhum desaforo. É uma questão de temperamento e de filosofia de vida. Não admito ofensa. Dou o troco”, garante o major.

Com uma vida dedicada ao regime militar, o major Curió não economiza nas críticas ao governo federal. No que diz respeito à segurança pública, por exemplo, o prefeito considera que o governo Lula é lento no combate ao crime. Ele defende que deve haver um trabalho de inteligência de informação e um sistema estratégico. Leia essa e outras opiniões do lendário Major Curió em entrevista exclusiva à UnB Agência:

UnB Agência – Como foi a organização de Serra Pelada?
Major Sebastião Curió Rodrigues de Moura
- A Serra surgiu da noite para o dia. O movimento migratório de garimpeiros foi impressionante. Como nós estávamos saindo de um conflito social (em referência à Guerrilha do Araguaia), havia, indiscutivelmente, um trabalho de massificação por parte dos componentes do Partido Comunista do Brasil (PC do B) e até mesmo de certas facções da esquerda clerical. Na época, eu era chefe do Setor de Informações do Exército e fui mandado para lá para conseguir conduzir aqueles homens numa política favorável ao governo. A intenção inicial não era dar apoio social nem comercial, mas sim político-ideológica. Para isso, nós tinhamos de conseguir meios de apoio com alimentação, saúde, segurança e pagamento justo do ouro. Consegui desviar aquela massa de toda e qualquer idéia de guerrilha.

UnB Agência – Desviou por meio de quê?
Major Curió
- Tecnicamente, esse é um trabalho de força especial. Entrei em Serra Pelada com uma equipe de governo e começamos a apoiar os garimpeiros. a idéia inicial era político-ideológica, trabalhamos com o hasteamento da bandeira todos os dias e com o incentivo ao patriotismo. Viva o Brasil! Viva o Brasil! Viva o Brasil! Cresceu o sentimento de patriotismo e ganhamos aquela massa toda.

UnB Agência - E como foi a criação do município de Curionópolis?
Major Curió - Aqui era o município de Marabá. As pessoas só conseguiam chegar a Serra Pelada por via aérea. Os aviões pousavam e decolavam constantemente e o fluxo de entrada e saída de homens aumentava a cada dia. A pista tornou-se pequena e o transpote via aérea caro e inviável. Por isso, começamos a construir a estrada e os garimpeiros trouxeram suas mulheres e filhos para o Km 30 da rodovia PA 275. Foi quando surgiu um povoado desordenado e sem infra-estrutura. Recebi ordem de Brasília pra queimá-lo, mas considerei que tinha uma missão difícil, que era de organizar a região. Abri ruas, construí o primeiro colégio, mandei distribuir lotes gratuitamente. Assim estruturamos a cidade. A população batizou o povoado com o nome de Curionópolis à revelia. Eu mesmo não queria. Bati o pé porque eu ainda estava vivo e só se dá nome em homenagem a alguma pessoa quando ela já morreu, mas não adiantou.

UnB Agência - Como o senhor avalia a situação de Serra Pelada hoje?
Major Curió
- Imagino o futuro de Serra Pelada como uma cidade emancipada, mas considero muito difícil a exploração das galerias subterrâneas. É totalmente impossível a lavra manual em Serra Pelada. A exploração tem de ser feita com uma tecnologia altamente especializada, que existe apenas no Canadá e na África do Sul. Além disso, a Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada (Coopmigasp), que é a que tem direito de explorar o solo, não presta contas para a Junta Comercial do Estado há dois anos. Assim, mesmo se ela conseguisse o alvará de lavra do governo federal, não poderia extrair ouro. Por outro lado, a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) virá explorar ferro aqui e isso trará impostos e desenvolvimento para a região.